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Schumacher, mais que um ídolo, um herói alemão

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22/VII/11

Livio Oricchio, de Nurburgring

Nico Rosberg, companheiro de equipe de Michael Schumacher na Mercedes, resumiu, ontem no circuito de Nurburgring, a razão de nos primeiros treinos do GP da Alemanha, hoje, nada menos de seis pilotos alemães entrarem na pista, ou 25 % do total: “O sucesso de Michael Schumacher representou um boom no interesse pela Fórmula 1 na Alemanha”. Mas o que pensa o povo alemão a respeito do responsável por essa enxurrada de representantes e, principalmente, ser o piloto de maior sucesso na história da competição, com sete títulos mundiais?

O diário Bild publicou o apurado numa enquete realizada em junho. Nada menos de 56.652 pessoas responderam à pergunta: qual o maior esportista alemão de todos os tempos? O resultado não deixa dúvida: Michael Schumacher, com 28,36% dos votos. É mais do dobro do segundo colocado, ninguém menos de o Kaiser, Franz Beckenbauer, ex-jogador e técnico de futebol, com 12,95% (veja o quadro). O Estado ouviu o piloto: “Fico feliz por ser uma votação aberta, vinda do povo. Votaram desde profissionais das mais simples atividades às mais complexas, portanto é representativo”.

Schumacher disse mais: “Sinto-me honrado. Se você ver o nível dos citados, são todos esportistas muito respeitados. Na realidade foi uma surpresa para mim”.

Um dos responsáveis pela reportagem do Bild é Helmut Uhl, há 33 anos na Fórmula 1. “Vimos que Michael é Michael. Por ele as pessoas acordavam para assistir a uma corrida às 5 ou 6 horas da manhã. Já para Sebastian Vettel não fazem o mesmo.” Os fãs de Schumacher apóiam Vettel, hoje, mas têm, segundo Ihl, outro tipo de relacionamento com o jovem. “Apenas idolatria. Já Schumacher ainda é um herói”, diz, lembrando o resultado da enquete.

Michael Schimidt, jornalista alemão dentre os mais conceituados, há 30 anos na Fórmula 1, do Auto Motor und Sport, tem uma explicação para até mesmo jovens que pouco viram Schumacher correr terem votado nele. “Não tem a ver com o que era no passado, mas com o fato de ter idade, 42 anos, saber desde o início que a equipe não iria lutar pelas vitórias, aceitar os riscos e desafios de tentar torná-la grande e a partir daí pensar em vencer novamente.”

Já a também jornalista Karin Sturm, há mais de 30 anos presente na competição, do motorsport-magazin.com, tem uma visão distinta. “A imprensa compreendeu que Schumacher não é mais o mesmo e lhe faz algumas críticas, como no seu envolvimento em acidentes recentes, com Vitaly Petrov e Kamui Kobayashi. É uma novidade porque ele sempre era intocável.” E, segundo explica, a identificação do jovem alemão hoje é bem maior com Vettel, de 23 anos e também já campeão do mundo.

Ao menos com relação a dois alemães acampados nas áreas ao redor do circuito a alegação da jornalista procede.  Wilfried Klein, estudante de férias, 20 anos, respondeu com uma única palavra, ontem, à questão por qual motivo principal enfrentava o frio e chuva em Nurburgring? “Sebastian.” Contou ter se deslocado 600 quilômetros para ver o ídolo de perto. Theodor Rech, 21 anos, é outro fã do atual campeão do mundo. “Quando Michael conquistou o seu último título (2004) eu estava entrando na adolescência, enquanto com Sebastian, no ano passado, vivi tudo com mais consciência.”

Quem acompanhou de perto o período em que Schumacher venceu os campeonatos de 2000 a 2004 e estabeleceu o recorde nos principais rankings de desempenho da Fórmula 1 chegou a conclusões definitivas quanto à natureza de seus fãs, no olhar da experiente jornalista. “O perfil médio do espectador nos autódromos, nas arquibancadas ou nos campings era de cidadãos de classe social mais baixa. Dentre os mais intelectualizados, há maior resistência na aceitação de Schumacher”, afirma Sturm.

A razão seria o seu envolvimento em incidentes dentre os mais polêmicos da história da Fórmula 1, como a iniciativa de jogar sua Benetton na direção da Williams de Damon Hill, em 1994, na Austrália, etapa final e decisiva, para ficar com o primeiro título. Ou a tentativa de fazer o mesmo com Jacques Villeneuve, em Jerez de la Frontera, Espanha, em 1997, já pela Ferrari, em condições semelhantes às de 1994. Desta vez sem sucesso. E sobre essa rejeição a Schumacher não há números, apenas a impressão de cidadãos que discutem temas relativos à Fórmula 1 com alemães, interessados ou não pela competição.

Meu comentário a respeito do tema:

Há dois Schumachers

Da estreia na Fórmula 1, no GP da Bélgica de 1991, ao GP do Brasil de 2006, Michael Schumacher disputou 250 GPs. Ficou de fora nas três temporadas seguintes para voltar a correr, pela Mercedes, no ano passado. Desses 250 GPs, talvez em cinco ou seis, apenas, não estive presente. Acompanhei de perto a notável trajetória do piloto mais completo que vi competir.

Mas nesse tempo todo, além de ir para o meio das pistas somente para ver como Schumacher percorria trechos de determinados circuitos, impressionado com sua competência, ouvi pilotos, técnicos e dirigentes que tiveram contato bem mais próximo do meu com ele. E nem todos teceram comentários apenas elogiosos a Schumacher.

“Ele é um piloto perigoso”, definiu Ayrton Senna no GP da França de 1992. “Para ele, os fins justificam os meios”, diz Rubens Barrichello, ex-companheiro na Ferrari, de 2000 a 2005.

Em conversa com alemães das mais distintas origens compreendi existir, sim, um grande respeito a Schumacher. Não foram poucas as vezes que ouvi a história de que sua mãe ajudava o orçamento da família vendendo lanches para os kartistas no kartódromo administrado pelo pai, Rolf, em Kerpen. E também o fato de ele usar pneus já desprezados por outros meninos por o pai, ex-pedreiro, não poder adquirir novos.

Mas também vi alemães se dizerem envergonhados com Schumacher, como depois de ser campeão em Adelaide, 1994, após jogar Damon Hill para fora da pista. Ou em Jerez, em 1997. Um grupo de músicos alemães estava ao lado de Placido Domingo, naquele dia, e enquanto o tenor externava, na entrevista, sua repugnação à tentativa de Schumacher colidir deliberadamente com Jacques Villeneuve para ficar com o título, os músicos, do lado, movimentavam as mãos como quem diz “que horror de esportista”.

Portanto, há mais de um Schumacher. O piloto, brilhante como talvez nenhum outro na história, e o homem, com muitas vidas ainda pela frente para entender o real papel da humanidade no planeta.


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